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segunda-feira, 4 de março de 2013

OAB aponta os cinco maiores problemas do Processo Judicial Eletrônico.

OAB aponta os cinco maiores problemas do Processo Judicial Eletrônico.

Brasília – Os presidentes das Comissões de Tecnologia da Informação de todas as Seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) debateram e apontaram, nesta quinta-feira (28), os cinco principais problemas detectados pela advocacia brasileira na utilização do Processo Judicial Eletrônico (PJe). A partir das experiências relatadas por cada Seccional, foram indicados como os cinco maiores obstáculos à implantação do processo eletrônico: a infraestrutura deficiente de Internet; dificuldades de acessibilidade; problemas nos sistemas de processo eletrônico; necessidade de melhorias na utilização do sistema; e a falta de unificação dos sistemas de processo eletrônico.

Os pontos foram elencados em reunião conduzida na sede da OAB pelo vice-presidente do Conselho Federal, Claudio Lamachia, e pelo presidente da Comissão Especial de Direito da Tecnologia e da Informação da OAB Nacional, Luiz Cláudio Allemand, com a participação dos presidentes das comissões responsáveis pelo setor nas 27 Seccionais. O diagnóstico hoje elaborado será remetido para o Pleno da OAB, que debaterá o tema e encaminhará as reivindicações da advocacia ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Ministério da Justiça e ao Tribunal Superior do Trabalho. O objetivo é alertar para a necessidade de suspensão das novas implantações até que sejam sanados os problemas estruturais, garantindo-se à advocacia o uso concomitante dos dois sistemas: o peticionamento online e o físico.

A infraestrutura deficiente de Internet foi o principal problema apontado entre os dirigentes, especialmente com referência às dificuldades de conexão à Internet e quedas no fornecimento de energia. Quanto à acessibilidade, as principais reivindicações são de um período de transição para a migração total do meio físico para o eletrônico e a necessidade de os tribunais disporem de estrutura para a digitalização dos processos, conforme prevê a lei do processo eletrônico. Entre as melhorias citadas para o uso do sistema, estão a correção das instabilidades e aumento na limitação de tamanho para o envio de arquivos.

Na condução da reunião, Claudio Lamachia destacou que, ao se instalar o PJe de forma obrigatória, sem que exista no país capacidade instalada de Internet em banda larga e 3G absolutamente confiável, se está, com isso, alijando os advogados do peticionamento online. “Não somos contrários ao PJe, mas contra a forma açodada que este vem sendo imposto à advocacia. Necessitamos de estrutura para trabalhar de forma eletrônica, sob pena de se negar o acesso à Justiça a milhares de cidadãos brasileiros ”.

Radiografia nos Estados

O presidente da Comissão de Tecnologia da Informação da OAB do Rio Grande do Norte, Hallrison Dantas, fez na reunião importante relato da realidade estrutural de que dispõe a advocacia potiguar. Segundo ele, imperam em mais de 30 municípios serviços de Internet discada e via rádio, sendo que nenhuma comunidade rural, sítio ou distrito do Estado é servida por banda larga. Apenas 31 cidades são atendidas pelo programa banda larga popular do governo federal. Com isso, caso o PJe venha a ser instalado de forma exclusiva no Rio Grande do Norte, quase um milhão de jurisdicionados ficarão sem acesso à Justiça. “A chegada da tecnologia para o peticionamento não nos passa a sensação de conforto. Quando PJe chegou, passamos a amar mais ainda a caneta e o papel. Não deveria ser assim.”

O presidente da Comissão de Tecnologia da Informação da OAB do Rio Grande do Sul, Miguel Ramos, criticou a existência de dois sistemas completamente diferentes no primeiro e segundo graus da Justiça Trabalhista, além de problemas graves de infra-estrutura. O presidente da Comissão da OAB do Espírito Santo, José Geraldo Pinto Junior, relatou a existência de cinco sistemas diferentes na Justiça capixaba, cenário também piorado com os problemas de infraestrutura de conexão à Internet, indisponibilidades do sistema PJe, necessidade de múltiplas certificações e limitação do tamanho dos arquivos enviados.

Nessa mesma linha, o presidente da Comissão da OAB-PA, Amadeu dos Anjos Junior, destacou que os problemas de estrutura de telecomunicações e de quedas de energia têm impedido a acessibilidade ao sistema pelos advogados. “Conforme os dados da Anatel, 93 municípios do Pará, do total de 134, têm apenas um acesso de banda larga e este se mostra falho. Pior: quando há indisponibilidade do sistema, o advogado não tem como provar que peticionou no prazo correto”, acrescentou.

Ricardo Lobo, da Comissão de Alagoas, apontou a obrigatoriedade de uso exclusivo do PJe como o problema mais grave. “Os advogados não tiveram chance de se adaptar como foi feito quando da declaração online do imposto de renda pelos contribuintes, que foi adotada de forma paulatina. Se o PJe é algo que foi criado para auxiliar a atuação dos advogados e ampliar o acesso do cidadão á Justiça e estes entendem que a migração não precisa ser imediata, precisamos nos manifestar e os Tribunais têm que nos ouvir”, afirmou.

Apenas dois Estados assinalaram a inexistência de problemas com a implantação do PJe: Tocantins e Sergipe. Nesse último, 100% das Varas do Trabalho utilizam o Pje, sendo que cada uma possui dois computadores para atender ao público e fazer a digitalização para advogados quando necessário. “Até o momento, há 1.591 advogados cadastrados para uso do PJe em Sergipe, de um total de cinco mil profissionais do Estado. Mais de 10 mil processos já foram ajuizados na Justiça Trabalhista desde à implantação do processo digital”, explanou Afonso de Oliva, da Comissão de Direito Eletrônico da OAB sergipana.

A pedido de Luiz Cláudio Allemand, as Seccionais enviarão na próxima semana levantamento detalhado da situação do Processo Judicial Eletrônico em cada Estado com informações dos problemas concretos detectados pelos advogados a partir da utilização do sistema. “A Comissão de Especial de Direito da Tecnologia e da Informação do Conselho Federal vai interagir com as 27 Seccionais para ter uma radiografia completa dos problemas enfrentados nos Estados e fazer a busca de soluções e alternativas”, afirmou Allemand. Também participou da reunião o vice-presidente da Comissão de Direito da Tecnologia e da Informação do Conselho Federal, José Mario Porto.

- Infraestrutura de Internet e energia:

Deve haver uma garantia por parte do Estado de acesso a infraestrutura básica de conexão a internet, por meio de telefonia fixa e móvel.

Constatam-se problemas:

1. de conexões a internet, seja por meio de telefonia fixa e móvel; 2. de fornecimento de energia em determinadas região do Brasil

- Acessibilidade:

O acesso à Justiça pleno é uma garantia constitucional.

Constatam-se problemas 1. de identificação:

1.1. uma grande porcentagem de advogados não possuem certificação digital;

1.2. os sistemas apresentam problemas de reconhecimento de certificados;

1.3. o acesso por meio de login e senha para identificação do advogado deve ser

franqueado como forma de garantia de acesso;

2. é necessária a coexistência do sistema PJe com outros meios que possibilitem o acesso a jurisdição até que os problemas de utilização dos sistemas estejam plenamente resolvidos;

3. deve haver uma auditoria externa de estabilidade do sistema com publicidade de paradas e instabilidades;

4. os Tribunais devem prover uma estrutura de acesso, na forma do artigo 10, § 3o, possibilitando os recursos mínimos para acesso das partes e advogados ao Poder Judiciário..

5. os sistemas devem permitir o acesso multiplataforma e o uso de diferentes sistemas operacionais e navegadores;

6. unificação de cadastro ao sistema de 1o e 2o garus e dos painéis de intimação dos advogados

- Sistemas de Processo Eletrônico:

A informação sobre os sistemas e sua performance deve ser pública, por questão de segurança jurídica.

1. os sistemas são gerados com softwares livres o que permite o acesso aos Códigos Fontes para análise e desenvolvimento de aplicativos que venham a minorar as dificuldades de acesso;

2. acesso ao memorial descritivo de arquitetura do software PJe;

3. acesso ao sistema Gira que permita acompanhamento por parte da OAB das solicitações de correções e problemas do sistema;

4. deve haver uma maior publicidade de versões, com a divulgação de listas de mudanças e aplicativos necessários para o funcionamento dos sistemas;

5. correção de forma mais rápida e eficiente dos erros e defeitos noticiados.

- Melhorias na utilização do sistema

O Sistema apresenta uma série problemas, erros e defeitos que dificultam a sua utilização e prejudicam a eficiência do Poder Judiciário e o acesso a Justiça.

Há necessidade de:

1. correção dos problemas de instabilidade do sistema;

2. uma maior publicidade dos atos processuais por meio de notas de expediente;

3. correção de problemas de controle de prazos, que em um mesmo processo apresenta a advogados do mesmo polo prazos diferenciados;

4. possibilidade de acesso a advogados às funcionalidades do escritório virtual utilizado por advogados públicos;

5. possibilidade de vinculação dos paralegais (estagiário, assessores e gestores) ao acervo de processos do advogado;

6. não imposição de utilização de editor de texto do sistema o que dificulta a digitação de textos;

7. aumento do tamanho dos arquivos para o envio e possibilidade do envio em lote;

8. melhoria do sistema de suporte, via web e telefone;

9. resolução de problema autenticação de documentos por meio de certificação digital.

- Unificação dos Sistemas de processo eletrônico:

A OAB defende a implantação de um sistema de processo eletrônico único, com padronização de versões e regulamentação uniforme de utilização.

1. Recomenda-se haver uma unificação dos sistemas de processo eletrônico nos Tribunais de todo o país, e uma padronização de versões, bem regulamentação uniforme de sua utilização.

Entre a centralização e a participação: a atuação de atores não governamentais na cooperação sul-sul brasileira., por Fernanda Cristina Nanci Izidro Gonçalves.

Entre a centralização e a participação: a atuação de atores não governamentais na cooperação sul-sul brasileira., por Fernanda Cristina Nanci Izidro Gonçalves.

O objetivo deste artigo é apresentar a tendência relativamente recente de participação de atores privados na Cooperação Sul-Sul (CSS) ofertada pelo Governo brasileiro. Entende-se como Cooperação Sul-Sul uma vertente particular da Cooperação Internacional ao Desenvolvimento, qual seja, a Cooperação Técnica entre Países em Desenvolvimento (CTPD).

A política de cooperação internacional brasileira é encarada como uma política de Estado pelo Governo. Tal percepção propiciou que a cooperação técnica tenha sido âmbito de atividade exclusiva do Estado, que detinha monopólio na condução das iniciativas (VALLER FILHO, 2007). Ainda hoje essa prevalência governamental na condução da cooperação técnica brasileira é existente, entretanto vem sendo relativizada. Atualmente, as atividades oficiais de CSS mobilizam diversos setores sociais, como ONGs, Associações Nacionais de Esportes e Organizações Privadas de Interesse Público, sinalizando uma tendência de descentralização nesta área, inserida dentro de um processo mais amplo de politização da política externa.

Nos anos 70, o país começou a estruturar um programa de cooperação brasileira ao exterior. O Brasil já havia se beneficiado da transferência de conhecimentos oriundos de países mais avançados, o que contribuiu para o desenvolvimento nacional e o tornou capaz de prestar cooperação para outros países. Neste contexto, inseriu-se na prestação de cooperação para países do Sul, impulsionado por uma política de aproximação e pela demanda externa pela cooperação nacional.

Para responder à crescente demanda por cooperação, o Governo mobilizou internamente diversas instituições que haviam se favorecido das políticas nacionais de captação de cooperação técnica internacional. O Itamaraty procurava articular as parcerias, buscando negociar os convênios com as instituições envolvidas (Ibid). Nesta época, as instituições convidadas a colaborar eram basicamente governamentais, como o Ministério da Saúde e a EMBRAPA. Como exceção à regra, figuravam apenas as organizações privadas de interesse público, como o SENAI, que possuía forte vínculo com o Estado.

Esse quadro sofre alterações a partir dos anos 90, devido ao impacto que a liberalização política e econômica, aliada a outros fatores, teve sobre a formulação da política externa. Ciente do novo contexto, em que atores sociais demandavam espaço na definição das políticas estatais, o Itamaraty procurou promover uma aproximação com a sociedade (Ibid).

O início formal da interlocução sobre cooperação ocorreu no Encontro Nacional de ONGs sobre Cooperação e Redes organizado por iniciativa da Agência Brasileira de Cooperação (ABC), em 1989. Esta iniciativa permitiu uma troca de informações entre os envolvidos e serviu para que a ABC conhecesse melhor as experiências dos atores privados e pudesse acrescentá-las à cooperação tradicional. Posteriormente, outras tentativas de aprofundar o diálogo sobre cooperação foram realizadas pela ABC (OLIVEIRA, 1999).

Em paralelo a este cenário doméstico, temas como descentralização, parcerias estratégicas público-privado e transparência ganharam notoriedade (VALLER FILHO, 2007). Seguindo a nova dinâmica interna e internacional, o país buscou descentralizar a gestão da cooperação.

A partir dos anos 1990, inaugurava-se, um segundo momento na prática de cooperação técnica brasileira. Essa nova etapa correspondeu a uma gestão da cooperação com feição mais participativa, em que o MRE procurou descentralizar o sistema de cooperação (Ibid). Porém, esta tendência também estava relacionada ao intuito da corporação diplomática ampliar suas bases de apoio, o que implicaria o aumento de sua legitimidade interna e externamente (Ibid). Soma-se a isto, o fato das atividades envolverem recursos públicos, o que torna o respaldo da sociedade importante para estas iniciativas (PUENTE, 2010).

Outra razão é a evolução de um relacionamento substantivo entre Governo e atores sociais internamente. A existência de um intercâmbio profícuo criou as condições para que fosse estabelecida uma relação mais colaborativa externamente (OLIVEIRA, 1999). Destaca-se ainda o surgimento de uma agenda internacional com novas obrigações, que fez com que o Governo buscasse fora de seu aparato burocrático os conhecimentos e específicos para lidar com questões que não são objeto de consideração substantiva dos diplomatas (Ibid).

Há também o intuito do Governo avançar na CSS, trabalhando em conjunto com interlocutores capazes de auxiliar a expandir as iniciativas de cooperação prestada e atender à crescente demanda. Ressalta-se que a escolha de parceiros cooperantes não é feita de modo arbitrário, mas de modo estratégico, privilegiando os que possuem expertise suficiente para implementar as ações demandadas.

Outra questão é que a medida em que os pleitos por cooperação aumentam, torna-se necessário procurar novas parcerias para executar os projetos. Para não sobrecarregar entidades cooperantes, procura-se diversificar os parceiros, ampliando a participação de atores privados e a oferta em outras áreas.

Como reflexo desta conjuntura, ampliou-se a interação entre Governo e sociedade na cooperação técnica. Porém, na prática, há ainda mais centralização do que participação dos atores privados. Embora o aspecto operacional da cooperação seja amplo e difuso, sua concepção e direcionamento são ainda restritos ao MRE (PUENTE, 2010).

Apesar da descentralização recente, ainda observa-se nesta área específica da política externa a existência de poucas parcerias público- privado, se comparado às parcerias existentes com atores governamentais. Ademais, mesmo que atores sociais proponham parceria com a ABC para prestação de cooperação, o projeto só é realizado se aprovado e em conformidade com objetivos da política externa.

Embora a ABC seja propensa à críticas por ainda centralizar consideravelmente a formulação da cooperação, é importante ressaltar que a centralização é parte de sua função, visto ter como atribuições negociar, coordenar e acompanhar os projetos brasileiros, orientando-se através das prioridades do MRE. Assim, caberia à política de cooperação brasileira crítica semelhante à política externa em geral, isto é, que é marcada por uma “tensão entre eficácia e representatividade” (PINHEIRO, 2002, p.2).

Isto porque por um lado procura se adaptar ao novo cenário político interno e às novas tendências internacionais, mas por outro lado busca resguardar a autonomia da ABC, objetivando não desviar o rumo das políticas de cooperação e comprometer as prioridades da agenda de cooperação brasileira. Enquanto isto não é solucionado, a atuação de atores privados na CSS brasileira permanecerá marcada pela tensão entre a participação e a centralização, tendência semelhante ao que ocorre na relação entre diplomacia e sociedade em outros assuntos da política externa.

Referências bibliográficas:

GONÇALVES, Fernanda Cristina Nanci Izidro. Cooperação Sul-Sul e Política Externa: um estudo sobre a participação de atores sociais. Dissertação de Mestrado. Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, maio de 2011.

OLIVEIRA, Miguel Darcy de. Cidadania e Globalização: a política externa brasileira e as ONGs. Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão (Funag), 1999.

PUENTE, Carlos Alfonso Iglesias. A cooperação técnica horizontal brasileira como instrumento de política externa: a evolução da cooperação técnica com países em desenvolvimento – CTPD no período 1995-2005. Brasília: FUNAG, 2010.

PINHEIRO, Leticia. Os Véus da Transparência: Política Externa e Democracia no Brasil. IRI Textos, Rio de Janeiro, n. 25, 2002.

VALLER FILHO, Wladimir. O Brasil e a crise haitiana: a cooperação técnica como instrumento de solidariedade e de ação diplomática. Brasília: FUNAG, 2007, p. 19.

Fernanda Cristina Nanci Izidro Gonçalves é Mestre em Relações Internacionais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro – PUC-RIO (fnanci@gmail.com).