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segunda-feira, 25 de agosto de 2014

ADVOGADO QUE NÃO COMPARECE À AUDIÊNCIA PERDE O DIREITO A PRODUZIR PROVAS.

Segue interessante Acórdão da Lavra do Desembargador Sérgio Izidoro Heil, o qual se manifesta no sentido de que o Advogado que não comparece à Audiência de Instrução e Julgamento não pode posteriormente suscitar Cerceamento de Defesa.

Apelação Cível n. 2010.039216-2, de Brusque
Relator: Des. Sérgio Izidoro Heil

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO DE PERMUTA VERBAL. ALEGAÇÃO DE NULIDADE PROCESSUAL DECORRENTE DA FALTA DE TOMADA DO DEPOIMENTO PESSOAL DO APELANTE. AFASTAMENTO. AUSÊNCIA DO LITIGANTE E DE SEU PROCURADOR AO ATO. CAUSÍDICO DEVIDAMENTE INTIMADO SOBRE A AUDIÊNCIA. RETORNO DE CARTA DE INTIMAÇÃO DA PARTE SEMCUMPRIMENTO. INTIMAÇÃO DO ADVOGADO PARA SE MANIFESTAR A RESPEITO NÃO ATENDIDA. MÁCULA DECORRENTE DE COMPORTAMENTO DA PRÓPRIA PARTE. INVIABILIDADE DE ALEGAÇÃO DA PRÓPRIA TORPEZA. CPC, ART. 243. DEPOIMENTO PESSOAL, ADEMAIS, QUE NÃO BENEFICIARIA O RECORRENTE. MEIO DE PROVA CUJA FINALIDADE É A OBTENÇÃO DE CONFISSÃO. INEXISTÊNCIA DE PREJUÍZO. CPC, ART. 249, § 1º. LITIGANTE, ADEMAIS, QUE NÃO JUSTIFICOU SUA AUSÊNCIA AO ATO. INDISPENSABILIDADE DE FAZÊ-LO ATÉ A ABERTURA DO MESMO. CPC, ART. 453, § 1º. INVALIDADE NÃO DECRETADA. PEDIDO DE REFORMA DA SENTENÇA, NO MÉRITO. AUSÊNCIA DE RAZÕES RECURSAIS QUANTO AO PONTO. DESATENDIMENTO DA FORMALIDADE PREVISTA NO ARTIGO 514, II, DO CPC. RECURSO CONHECIDO EM PARTE E, NESTA EXTENSÃO, DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n.2010.039216-2, da comarca de Brusque (Vara Cível), em que é apelante Osmar Cupertino Xavier Filho, e são apelados Alcides Bernhardt Filho e outro:

A QUINTA CÂMARA DE DIREITO CIVIL DECIDIU, À UNANIMIDADE, CONHECER EM PARTE DO RECURSO E, NESTA EXTENSÃO, DESPROVÊ-LO.CUSTAS NA FORMA DA LEI.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Exmos. Srs. Des. Henry Petry Junior e Odson Cardoso Filho.

Florianópolis, 14 de agosto de 2014.

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação cível interposto por Osmar Cupertino Xavier Filho em face de sentença que, nos autos da "ação rescisória de contrato de permuta verbal c/c reivindicatória de posse e perdas e danos" n. 011.05.007550-1,movida em desfavor do casal Alcides Bernhardt Filho e Sueli Bissoni Bernhardt, julgou improcedente o pedido inicial e condenou o apelante ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes fixados em R$ 1.000,00 (mil reais), com exigibilidade suspensa em face do deferimento da Justiça Gratuita (fls. 150/153). 

Em suas razões, recursais, sustentou, em síntese, a ocorrência de cerceamento de defesa, consiste na falta de tomada de seu depoimento pessoal,tendo-se em vista sua ausência à audiência por problemas pessoais. 

Concluiu com pedidos de anulação da sentença ou de reforma da sentença (fls. 156/162).

Sem preparo, ante o deferimento do benefício da Justiça Gratuita, e com as contrarrazões (fls. 167/174), os autos ascenderam a esta Corte de Justiça.

VOTO

Como visto por ocasião do relatório, o único pleito recursal devidamente fundamentado no apelo foi o de anulação da sentença. Disse o recorrente, em síntese, estar maculado o processo por não ter sido tomado seu depoimento pessoal, situação que ocasionou cerceamento de defesa por não lhe permitir contar sua versão dos fatos.

Não obstante o articulado, mostra-se inviável acolher a pretensão manifestada. 

De início, indispensável ressaltar que nem o autor, nem seu procurador, compareceram à audiência de instrução e julgamento. O causídico, conforme apontado na ata de audiência e comprovado pela certidão de fls. 134/135, foi devidamente intimado da realização do ato por meio do Diário da Justiça. Já a carta para intimação do litigante retornou sem cumprimento, não tendo seu advogado feito qualquer requerimento a respeito, mesmo intimado para tanto (fl. 139).

Vê-se, portanto, que a falta de inquirição do autor se deu tão-somente em razão de sua própria desídia, de modo que não pode alegar qualquer nulidade processual porque a ela deu causa. Dito de outro modo, não pode a parte se beneficiar de nulidade a que deu causa, em decorrência do princípio de que a ninguém é dado se aproveitar da própria torpeza. Este o sentido do artigo 243 do CPC:

Art. 243. Quando a lei prescrever determinada forma, sob pena de nulidade, a decretação desta não pode ser requerida pela parte que Ihe deu causa. 

Neste sentido, colhe-se da jurisprudência do STJ, em caso assemelhado:  

Não aproveita ao recorrente a alegativa de que se deve acolher a nulidade de todos os atos processuais praticados pelo advogado irregularmente constituído, haja vista que não pode beneficiar-se do suscitado vício aquele que lhe deu causa. Precedente: REsp 685.744/BA, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, Terceira Turma, DJ 29.6.07 (AgRg no AREsp 281.994/RJ, rel. Min. Castro Meira, j. 11.4.2013).

De outro vértice, a produção do depoimento pessoal do autor não se prestaria a alterar a solução da lide, tendo-se em vista que a função do referido meio de prova é, apenas, conseguir a confissão da parte. Assim sendo, não tem tal modalidade probatória o condão de melhorar a situação do depoente, prestando-se apenas a obter desse a admissão de fatos contrários a seu interesse.

Neste sentido, colhe-se da lição de Antonio Carlos de Araújo Cintra:

Depoimento pessoal, no sistema do Código de Processo Civil, é meio de prova consistente nas respostas da parte às perguntas que lhe foram feitas pelo juíz "sobre os fatos da causa" (Código de Processo Civil, artigo 342), ou seja, "sobre os fatos articulados" no processo (Código de Processo Civil, artigo 346), tanto os fatos jurídicos típicos como os fatos simples alegados. Aquelas respostas constituem declarações representativas de ciência dos fatos a que se referem.

É claro que, na medida em que o depoente se limita a confirmar as alegações de fato que fizera no processo, nada acrescente ao que já havia afirmado, pois a mera reiteração não reforça o poder persuasivo das declarações anteriores. Por isso, como fonte de prova, o conteúdo das declarações feitas em depoimento pessoal somente tem relevância quando, afastando-se das afirmações anteriormente feitas, pelo próprio depoente, for desfavorável ao seu interesse. Assim, vê-se que, através do depoimento pessoal o que procura é provocar a confissão do depoente (Código de Processo Civil, artigo 349, caput, última parte). Realmente, sendo desfavorável ao interesse do depoente o conteúdo de suas declarações, mas favorável ao interesse de seu adversário no processo,caracteriza-se a confissão judicial (Código de Processo Civil, artigo 348) (...) (in: Comentários ao Código de Processo Civil. v. 4: arts. 332 a 475. Rio de Janeiro: Forense, 2008. p. 43) (grifo nosso).

No mesmo norte, a lição de Nelson Nery Jr e Rosa Maria de Andrade Nery, em comentário ao artigo 343 do Código de Processo Civil:

1. Conceito de depoimento pessoal. É meio de prova que tem como principal finalidade fazer com que a parte que o requereu obtenha a confissão, espontânea ou provocada, da parte contrária sobre fatos relevantes à solução da causa ( in: Código de Processo Civil comentado e legislação extravagante. 11. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. p. 645).

Sob tal ótica, inexistiu qualquer prejuízo à parte demandante, o que também impediria a decretação de nulidade processual, se a mácula não fosse imputável exclusivamente ao apelante. É o que determina o § 1º do artigo 249 do CPC:

Art. 249. O juiz, ao pronunciar a nulidade, declarará que atos são atingidos, ordenando as providências necessárias, a fim de que sejam repetidos, ou retificados.

§ 1º O ato não se repetirá nem se Ihe suprirá a falta quando não prejudicar a parte.

Com este entendimento, esta Corte já decidiu:

Com arrimo no princípio da economia processual, bem como por entender ser aplicável o princípio do pas de nullité sans grief (ou seja, um ato só terá sua nulidade decretada se não se puder aproveitá-lo dado que pela forma como fora praticado, causou prejuízo a uma das partes), o ato judicial deve ser convalidado porque não se verifica prejuízos às partes (AC n. 2010.067215-6, de Tubarão, rel. Des. Gilberto Gomes de Oliveira, j. 29.5.2014).

Ainda:

Não evidenciado o prejuízo decorrente da apontada irregularidade processual, é de ser afastada a eiva de nulidade da sentença com substrato no princípio da instrumentalidade, consagrado na expressão francesa "pas de nullité sans grief" (AC n. 2010.082143-6, de Chapecó, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, j. 25.6.2013).

Do STJ, adotando idêntico posicionamento, colhe-se: 

À luz do Princípio da Instrumentalidade das formas e dos atos processuais, norteador do Sistema de Nulidades do Código de Processo Civil, ainda que haja expressa inobservância da forma do ato exigido por lei, não se decretará a nulidade- do ato quando a inobservância da forma não resultar prejuízo para a parte (art. 249, § 1º. Do CPC) (REsp 766.506/RS, rel. p/ Acórdão Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 10.9.2013).

Não fosse isto suficiente, disse a parte que "por problemas pessoais, não pôde ser ouvido em audiência de instrução " (fl. 158). Em tal situação, cabe ao litigante, até a abertura do ato, justificar a necessidade de adiamento, nos moldes do artigo 453 do CPC:

Art. 453. A audiência poderá ser adiada:

I - por convenção das partes, caso em que só será admissível uma vez;
Il - se não puderem comparecer, por motivo justificado, o perito, as partes, as testemunhas ou os advogados.

§ 1º Incumbe ao advogado provar o impedimento até a abertura da audiência; não o fazendo, o juiz procederá à instrução (...).

Na hipótese, nada há nos autos a amparar a alegação de justo impedimento. A parte se limitou a alegar tal situação, mas não a demonstrou com provas, o que impede o acolhimento da afirmativa.

A respeito, em hipótese assemelhada, o STJ já decidiu: 

PROCESSUAL CIVIL. ADIAMENTO DE AUDIENCIA. AUSENCIA DO ADVOGADO. IMPOSSIBILIDADE DE SEU COMPARECIMENTO. INDISPENSABILIDADE DA COMPROVAÇÃO DO JUSTO MOTIVO ALEGADO. ART. 453 DO CPC. O ADVOGADO TEM QUE COMPROVAR O MOTIVO QUE JUSTIFICARIA O SEU IMPEDIMENTO PARA COMPARECER A AUDIENCIA PREVIAMENTE DESIGNADA, SENDO INSUFICIENTES MERAS ALEGAÇÕES. RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO (REsp 62.357/ES, rel. Min. Cesar Asfor Rocha, j. 18.6.1996).

Neste passo, por qualquer ângulo que se observe a questão, verifica-senão ser possível decretar a nulidade almejada pelo apelante. Deve, portanto, ser mantida hígida a sentença. Finalmente, no tocante à pretensão de reforma da sentença em seu mérito,extrai-se das razões recursais a completa ausência de fundamentação a respeito. Embora haja pedido de alteração da decisão, nenhuma linha das razões recursais foi dedicada a demonstrar os motivos do desacerto do ato compositivo da lide.
Neste ponto, não se pode conhecer da irresignação, tendo-se em mente ser requisito intrínseco do apelo a existência de fundamentação. É o que se extrai do artigo 514 do Código de Processo Civil:

Art. 514. A apelação, interposta por petição dirigida ao juiz, conterá: I - os nomes e a qualificação das partes;

II - os fundamentos de fato e de direito;
III - o pedido de nova decisão (grifo nosso).

A respeito, recorre-se mais uma vez às lições de Nelson Nery Jr e Rosa Maria de Andrade Nery: 

II: 5. Fundamentação. O apelante deve dar as razões, de fato e de direito, pelas quais entende deva ser anulada ou reformada a sentença recorrida. Sem as razões do inconformismo, o recurso não pode ser conhecido ( in: Código de Processo Civil comentado e legislação extravagante. 11. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. p. 890).

Esta Corte, em casos similares, já decidiu:

Sob pena de não ver conhecido o recurso, deve a parte apelante observar o disposto no inciso II do art. 514 do CPC, expondo com objetividade os motivos de seu inconformismo, demonstrando as razões de fato e de direito indicadoras dos vícios da sentença que justificam a reforma pretendida (AC n. 2013.053651-2, de Jaraguá do Sul, rel. Des. Paulo Roberto Camargo Costa, j. 10.7.2014).

Mais:

Conforme entendimento doutrinário e jurisprudencial, as razões recursais devem expor objetivamente os motivos do incoformismo, demonstrando os motivos de fato e de direito que socorrem o interesse recursal, respeitando o princípio da dialeticidade (AC n. 2011.093053-2, de Itajaí, rel. Des. Carlos Adilson Silva, j. 24.6.2014).

Ante o exposto, vota-se por conhecer em parte do apelo e, nesta extensão,negar-lhe provimento.

Gabinete Des. Sérgio Izidoro Heil

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